Neste dia repleto de religiosidade, vale a reflexão sobre o ato singelo e profundamente corajoso – que lavou a alma dos brasileiros que ainda não perderam totalmente a capacidade de se indignar – do bispo de Limoeiro do Norte (CE), dom Manuel Edmilson Cruz. O tapa com luva de pelica que deu nos políticos ao recusar, em pleno Senado, a comenda Dom Helder Câmara – por causa do aumento de salário que os deputados e senadores concederam a si próprios – ressoou mais do que protestos em praça pública ou artigos da imprensa. Sem violência ou ranger de dentes, fez cair a máscara dos políticos irresponsáveis – atitude diferente da de um palhaço que acaba de virar deputado e disse, ao entrar no Congresso, que chegava “numa boa hora”, referindo-se ao aumento.
O gesto não foi uma crítica exatamente ao salário dos parlamentares. Não se deve achar ruim um deputado ou senador ganhar bem. Até porque, se ganhasse mal, a maioria teria isso como eventual desculpa para a corrupção – quantas e quantas vezes já ouvimos que os policiais se curvam aos bandidos porque ganham mal?
A indignação vem do oportunismo, da busca da brecha na lei, da falta de escrúpulo, da impossibilidade de contestação de uma ação tão flagrantemente legal quanto imoral. Dom Manuel foi longe ao apontar caminhos para minimizar o escândalo: um reajuste no salário dos políticos deveria ser concomitante e do mesmo tamanho do aumento do salário mínimo e das aposentados. Isso porque o religioso é generoso com os parlamentares, porque até esse paralelismo é discutível.
Tudo isso só acontece porque a classe política não se vê como servidora pública. Agem, em sua maioria, seus integrantes de modo totalmente contrário, ou seja, servindo-se da famosa “coisa pública” com apetite voraz. Se os serviços que prestam fossem compatíveis com a fartura de recursos que recebem, talvez dom Manuel até aceitasse a comenda. O mais desesperador para quem zela pelos interesses públicos é que a solução para esse e outros problemas seria uma ampla reforma política. Mas quem pode alimentar essa “galinha” é justamente a raposa.
Apesar desses pesares, um feliz Natal para todos.
Fonte:
Jornal da CBN;
Jornal do Brasil, em: http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2010/12/24/pode-se-tirar-as-mascaras-ruins-sem-violencia/
Até Mais;
Rodrigo D. Silva.
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